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tendes sabido soffrer; mas este mesmo valor accrescenta hoje ao seu antigo character o da indignaçaõ, e da vingança, que acendem em vossos coraçoens a horrivel violencia, e atroz perfidia do Imperador dos Francezes. Este homem horroroso vos olha como um rebanho de carneiros, que errando pelos campos durante a ausencia do pastor, vem a ser a preza do primeiro occupante. Mas enganou-se nos calculos de sua politica particular; e créo evitar uma guerra de gabinete, quando achou uma guerra nacional. Bonaparte sabe muito bem que, na quella, he facil o vencer pela prevaricaçao de um ministro, ou pela corrupçaõ de um general; porém jamais entrou em seus calculos, e menos podia elle prever, que cada Alcaide sería um general, cada municipalidade um gabinete; cada habitante um soldado, e que a corrupçaõ naõ póde nada sobre todo um povo. A guerra actual, he na verdade, uma guerra de Vandalos; ella naõ entrou ja mais na imaginaçaõ dos escriptores politicos; elles suppozéram 'que éra impossivel ver nascer guerras desta natureza; porque naõ pensáram que fosse possivel que nascesse um Bonaparte. Meus charos compatriotas vós nao tendes meio. He precizo que vós ou combatais, cubertos de honras e ricos de bençaós, pelos objectos mais dignos de vossa ternura; ou que morrais em outras regioens, cubertos de infamia, para sustentar os caprichos de Napoleaó. Esta guerra he immensa, eu o sei; nao se lhe vê o fim; mas a guerra da successaõ foi tambem uma guerra longa e cruel: ella náő promettia ter mais curto termo: mas uma sabedoria superior, que mofa da sabedoria orgulhosa do homem, permittio que ella terminasse, ao momento em que menos se pensava, por uma frivola disputa sobre um par deluvas. E que! Este Deus de bondade offendido em sua Religiaõ, e em suas crea turas, decidiría que uma fosse continuamente ultrajada; e que nao chegasse nunca uma epocha de alivio para as outras? Naõ, meus charos, e amados compatriotas: a justiça divina conserva todos os seus direitos, contra o author de tantos males. Vós sois o instrumento que Deus escolheo, para manifestar o seu Poder, e ainda nao chegou o momento, em que a colera divina tem de devorar este colosso como uma palha. Chegará o dia em que elle nos dará o objecto de nossos votos, Fernando, a fim de que vivamos em uma paz, prospera e duravel, debaixo do doce imperio das leys, que nos observaremos tanto melhor, quanto o nosso rey será, o mesmo que nos dara o exemplo; este rey que está persuadido de que os Soberanos naõ tem outra alternativa, ou de unir o amor e a prosperidade dos seus subditos á obediencia das leys, ou de attrahir contra si o odio delles, deixando-se dominar pelo capricho dos cortezaós, ou pelo delirio das paixoens. Grandes e sagrados como saõ os objectos deste escripto, sinto que he superior ás minhas forças, o desenvolvêllos com a dignidade que merecem, porém nada me podia dispensar de preencher, em tanto quanto está em meu poder, os meus deveres para com o meu Deus, meu rey, minha patria, e para comigo mesmo.

Politica particular de Bonaparte, &c.

Haviam decorrido mui poucos annos desde que Bona-. parte entrára na carreira militar, quando o Directorio o nomeou general em chefe do exercito de Italia, cujas bellas provincias, tao favorecidas da natureza, se tornáram, em pouco tempo, sob elle, um theatro de ruina e desolaçaõ.

Os males que produz o flagello devorante da guerra, sað tað terriveis, tao numerosos, e tað geraes, que ninguem se póde subtrahir aos funestos effeitos de sua terrivel actividade; porém todos estes males naõ saõ nada para saciar o coraçao sanguinario de Napoleaõ, deste inimigo de Deus, e dos homens. Elle quer que se soffra sem consolaçaó, sem recursos, em fim sem a esperança de melhor sorte; e como elle sabe que todos estes beneficios se acham na terna e compadecida Religiaõ Catholica, he por isto mesmo que elle tem tentado todos os meios de a extirpar.

Ja o Directorio tinha concebido o horroroso projecto de destruir aquillo que, pelo testemunho de quem he a pura verdade, he indestructivel; e Bonaparte ancioso de provar, que naõ foi em vaõ que elle mereceo a confiança daquelle Corpo Oligarchico, reduzio a systema os seus projectos. Formou elle o impio plano de destruir a obra de Jezus Christo, e escolheo o cidadaõ Serbelloni, para ser o Apostolo da incredulidade.

Apresentar dabaixo das cores as mais seductoras as duvidas, que os incredulos tem avançado para atacar as verdades da Religiaõ Catholica; enfraquecer as provas que depõem a favor do christianismo, taes como a admiravel vida e morte de seu divino author, a sabedoria, e sanctidade de seus preceitos, a authoridade e sublimidade das sanctas Escrituras, o testemunho dos Apostolos, o sangue de tantos martyres, o preenchimento das profecias, a vóz estrondosa dos milagres, a conversaõ do Mundo inteiro, a duraçao perpetua, e inalteravel da Igreja; e tantas outras provas de um tað grande pezo aos olhos mesano da razaõ; taes fóram os attributos da missaõ sacrilega de Serbelloni; e foi para realizar objectos tao vastos, e taó impios, que elle recebeo de Bonaparte as seguintes.

Instrucçoens remettidas aos 18 Brumaire, anno 50 da Republica Franceza, ao Director Serbelloni, pelo general Bonaparte, que as remetteo ao Directorio aos 21 do mesmo mez.

Roma despojada de suas duas espadas, por um povo, que não faz conquistas senao em proveito da liberdade e da razaõ, nutre um odio mortal contra nós, que se nao póde extinguir por meio algum, e que só o temor poderá dobrar.

O seu odio implacavel, activo mas prudente em suas declaraçoens, obra com um zelo infatigavel, por todos os meios que estaõ ao seu alcance, e estes meios estaõ bem longe de ser despreziveis. Se elles saõ terriveis mesmo á França victoriosa da Europa, deve ser claro que elles o seraõ muito mais á Republica Cisalpina.

Sería vao tentar transacçoens de boa fé com Roma. Eu mesmo a pezar desta certeza, julguei perigoso destruir o seu poder, e suspendi a sua ruina que estava entaŭ nas minhas maõs, pelo temor de augmentar o seu poder entre nós, destruindo-o no seu berço. Tenho feito as reflexoens mais profundas, e mais prudentes sobre o estado destes restos de superstiçoens humanas. A conducta, que vós me tendes visto observar a respeito do Papa, he o resultado disto.

Os mesmos povos da França, e entre outros os que habitam a Belgia, a Bretanha, a Normandia, o Poitou, o Languedoc e a Provença, estaō, quanto ás luzes, a uma grande distancia do Governo. Só a philosophia dirige a este, entretanto que os outros sao os escravos dos prejuizos, e sobre tudo dos prejuizos religiosos.

Porém como a força do Governo reside na vontade do povo, elle naõ póde sempre fazer o que quer, e he preciso que eleve á altura de seus conhecimentos o povo Soberano, a fim de poder fazer uso de todas as suas forças, e de todos os seus meios.

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Se tal he a posição da França, a vossa he ainda peior, a philosophia do Directorio, e as opinioens deste povo em materias de religiaõ, saō absolutamente oppostas. cousas tem chegado a um tal ponto, que vós sabeis mui bem as excellentes razoens que fazem, que elle mesmo se opponha á tolerancia publica das diversas religioens. As vossas razoens éram prudentes, e até ao presente a experiencia tem provado ao Directorio da Republica FranVOL. VIII. No. 45.

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ceza, que o espirito publico da Cesalpina, está ainda no tempo da infancia.

Tal he a nossa posiçaõ relativamente a França. Ella apresenta certamente grandes difficuldades. As Potencias as augmentaõ sobrecarregando sem cessar as cadêas do erro, a fim de se assegurar melhor da fidelidade de sens póvos. Ellas vaõ até o ponto de incensar este velho idolo decrepito, cujo throno, comido do caruncho se desfaria e cahiria em pedaços com o seu proprio pezo, se os differentes Estados o naõ sustentassem.

Este velho idolo será destruido dos pés até a cabeça: assim o querem a liberdade e a philosophia: mas quando, e como, he sómente a politica que o deve determinar. A este respeito vós sabeis que a sorte de Roina depende de consideraçoens demasiado grandes, para que vós possaes fazer cousa nenhuma por vos somente: mas a Republica Cisalpina deve ajudar-nos, e preparar os seus povos ao aviltamento da doutrina catholica, para lhe fazer desejar a ruina desta Religiaō, e unillos à sua destruiçaó pelo seu interesse pessoal; e para isto, antes de confiscar os bens do clero, os vossos escriptores deveraō representállos como bens vergonhosamente usurpados pelo charlatanismo.

Durante este tempo vós tereis de propagar os principios philosophicos, em todo o Estado Ecclesiastico. A França põem em vós a maior confiança para este fim, porque fallando a mesma lingua, tendo os mesmos habitos e o mesmo genio, os vossos philosophos devem destruir a superstiçaõ; por todos os meios da grande influencia, que tem sobre o coraçao, genio, e espírito dos povos.

Segundo a mim, nada podería ser mais desgradavel do que um acontecimento que obrigasse o Governo Francez, e os seus alliados na Italia, a sahir dos limites da prudencia, que a sua politica lhe tem prescripto. Este acontecimento sería a morte de Pio VII. He para desejar que elle viva ainda dous annos, para consumar

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