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Este pensamento, aliás generoso, e philantropico, porém não convenientemente sasonado, e concluido, além disso, sob a pressão de circumstancias todas desfavoraveis ao reino de Portugal, marcou, como era de prever, a data de futuras contestações, e immediata mente trouxe graves perigos ao commercio portuguez.

Na verdade aquella impolitica concessão affigurousé desde logo á Inglaterra como dando-lhe asada opportunidade de extinguir a escravatura nas terras do Brasil; e, pois, seu cruzeiro começou a aprezar navios dentro dos limites designados pela dita convenção, como paragens em que o trafico de escravos era admittido,dispondo outrosim dos carergamentos apresados, sem a menor interferencia de seus legitimos donos. Semelhantes attentados commettidos pela marinha ingleza causárão geral animadversão no paiz, e tão alto subirão as queixas, e tão fundadas erão ellas, que a Grã-Bretanha foi impellida a indemnisar, ainda que serodiamante, pela convenção de 1815, aos proprietarios desse navios das depredações que havião soffrido, estipulando-se para esse fim a quantia de trezentas mil libras esterlinas.

As outras condições do referido tratado mui prodigamente favoraveis á Inglaterra, forão de grave detrimento para Portugal. Os avultados favores concedidos á introducção de mercadorias inglezas em um paiz nascente como o Brasil, matou, desde o começo, o desenvolvimento das industrias, que não puderão soffrer a competencia das daquella nação.

A industria serica, a do anil, e coxonilha, que no

tempo do vice-reinado de Luiz de Vasconcellos tinha sido ensaiada na provincia de Santa Catharina sob o governo do tenente-coronel de artilharia José Pereira Pinto (1); a do canhamo, e do trigo, que se inaugurára na provincia de S. Pedro do Sul com tão beneficos resultados; a dos tecidos de algodão; a dos cortumes; salinas (2); e tantas outras, que, depois da

(1) Este illustrade militar administrou a provincia de Santa Catharina por espaço de seis annos, e sobre seu utilissimo governo fallão, com o maior elogio, Pizarro, o visconde de S. Leopoldo, Fernando Diniz, e a sua importante correspondencia com o Vice-Rei, depositada no archivo publico.

(2) O anil desenvolveu-se espontaneamente, e propagou-se com facilidade pelos terrenos da capitania do Rio de Janeiro, mórmente nos de Cabo-Frio, onde se montárão mais de quatrocentas fabricas. A cochonilla, originaria do paiz, pois fôra encontrada nas capitanias de S. Pedro do Sul, Santa Catharina, Bahia e Pará, começou a prosperar; o monopolio, porém, que se arrogou o governo na sua compra, e exportação, causou-lhe a decadencia. A creação do bicho da seda apresentou excellentes amostras, e a sua producção dobrava, e triplicava annualmente; a falta de systema, e habilitações precisas da parte daquelles encarregados de criar, e propagar o bicho, fez perder os capitaes empregados nessa industria. O canhamo, que no anno de 1807 dera 2,170 arrobas e 26 libras, além de 305 arrobas de estopa, c 102 alqueires de linhaça, veio a fenecer.

O algodão, planta indigena do paiz, e cuja exportação já em 1786 orçára por cerca de 2,000,000 de libras, e que mais tarde em 1802 se clevára a 11,480,280 libras, foi igualmente decahindo. A extracção do sal, producto espontaneo de diversas capitanias, e que era colhido abundantemente pelos circumvisinhos moradores, foi prohibida por duas cartas régias, a pretexto de que diminuia o commercio do reino.

(Extrahido da Historia da Fundação do Imperio Brasileiro por Pereira da Silva.)

abertura dos portos, e da cessação dos monopolios da metropole, poderião ser vantajosamente exploradas, ficárão abafadas pela concurrencia britannica, e ainda hoje jazem abandonadas, sendo que até o corte de soberbas madeiras, que crescem altivas em nossas matas, e a extracção do magnifico ferro, que se encontra em copiosos mananciaes em tantas de nossas ricas montanhas, não têm lido incremento, desde que, pelas franquezas outorgadas pelos tratados, tão facil é abarrotar o nosso mercado de generos similares da Europa, aliás de inferior qualidade, mas cuja acquisição se obtem por preço proporcionalmente mais. modico. Não assim aconteceria se no tratado de commercio, em vez de baixarem-se a quinze por cento (3) os direitos de importação, fossem pelo menos conservados os de vinte e quatro por cento, marcados na carta régia de 28 de Janeiro de 1808.

Em these, não applaudimos a doutrina proteccionista, mas, quando observamos que na França Imperial

(3) O maximum de quinze por cento para os direitos de importação favoreceu com excesso as mercadorias inglezas pelo exclusivo que conservárão até 1826, em que, celebrando-se o tratado de commercio com a França, taxou-se aquelles mesmos direitos; fez nascer a lei de 24 de Setembro de 1828, igualando para todas as nações os referidos direitos de quinze por cento; e finalmente creou em 1837 a necessidade de mandar-se um ministro (o marquez de Barbacena) a Londres, para tratar da revogação do art. 19 do tratado de commercio de 1827, em o qual igualmente se renovára a citada estipulação dos quinze por cento, estipulação essa que a experiencia mostrára ser de toda a desvantagem para o Brasil.

de nossos dias o illustrado Thiers, tão avisado nas praticas financeiras, e administrativas, demonstrando na tribuna que o novo systema de livre permutação havia completamente arruinado as colonias francezas, propôz, e fez approvar uma emenda importante, concedendo aos assucares coloniaes uma diminuição de direitos de cinco francos por cada cem kilogrammos durante o espaço de seis annos; quando attentamos que na propria Inglaterra essa doutrina encontra sectarios em homens notaveis, e que, ainda depois da transformação porque esse paiz passou no tempo de Peel, vozes autorisadas se têm elevado para defendê-la ; hesitamos emaceita-la em toda a sua expansão, e sem criterio, para uma nação nova, e cuja industria agricola, ou manufactureira está, por assim dizer, em embrião (4).

(4) Depois de cincoenta e quatro annos de data do tratado de 1810, o parlamento brasileiro acaba de reconhecer a necessidade de dar favores à importação, e exportação de differentes generos, para animar a navegação, a pesca, a introducção de raças finas de animaes domesticos, os lanificios nacionaes, as fabricas de refinação de assucar, e o commercio de carnes salgadas.

Na lei do orçamento do exercicio de 1865 a 1866 forão approvados os artigos additivos seguintes:

Art. 29 (additivo). O governo fica autorisado para:

$ 4. Conceder isenção de direitos de importação para os seguintes objectos:

1. Cordoalhas, lonas, aleatrão, ancoras, e mais artigos navaes, destinados ás embarcações mercantes: o governo formulará uma tabella de todos estes artigos.

2. Animaes domesticos, introduzidos no Imperio para melhoramento das raças.

O art. 4o do tratado de commercio de 1810, reproduzido no de Agosto de 1827, concedendo tambem avantajados favores aos navios inglezes no tocante aos direitos de tonelagem, e ancoragem, foi talvez a origem que levou posteriormente o governo brasileiro, pela Lei de 15 de Novembro de 1831, a impôr os referidos direitos de ancoragem sobre as embarcações nacionaes (5).

Pelo art. 10 estabeleceu-se dentro do paiz uma jurisdicção privativa para a Grã-Bretanha, e ao magistrado encarregado de a exercer deu-se o titulo de juiz conservador da Nação Ingleza. Esta clausula, transportada depois para o art. 6° do tratado de 1827, foi afinal abolida, não sem graves contestações

3.° Objectos destinados á pesca, tanto no alto mar, como nas costas, rios, e lagôas do interior.

4. Objectos importados directamente para contrucção ou conservação, e reparo das obras provinciaes, e municipaes. $ 5. Conceder isenção dos direitos de exportação aos seguintes objectos:

Lă de producção nacional.

Productos das fabricas de refinação, e crystallisação de assucar, que o governo designar.

Gado em pé, e carnes salgadas em balsa, ou por qualquer preparação, que o governo julgar digna deste favor.

(5) Ministerio da Fazenda.-Lei de 15 de Novembro de 1831. 7. Será cobrada uma imposição de ancoragem sobre todas as embarcações que navegão para os porios fóra do Imperio, na razão de dez réis diarios por tonellada, contados dentro de cincoenta dias depois de cada entrada nos portos do Imperio, ou até abandono legal antes deste prazo; fica comprehendida nesta imposição qualquer outra que até agora se cobrava debaixo da mesma denominação.

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